Notícias

>

Para superar o maior desafio da minha vida, coloquei em prática a minha experiência como atleta

Phil Rajzman compartilha uma experiência muito intensa que viveu nesse último ano e que ensinou mais o quanto é importante viver o presente, acreditar e ter fé.

Escrito por

Phil Rajzman

|

Publicado em:

23/07/2024

|

Atualizado em:

23/07/2024

-

17:19

|

6 min de leitura

6 min de leitura

Share on linkedin
Share on facebook
Share on twitter
Share on whatsapp

Vamos a história. Em agosto do ano passado comecei a sentir dificuldade na minha digestão, os alimentos não caiam tão bem quanto antes e achei que era gastrite. Até que na semana do Natal passei muito mal e já não conseguia mais comer, foi quando apalpei meu estômago e senti uma bola e resolvi ir ao médico. Pela urgência, fiz uma série de exames, mas eu estava no Havaí, onde o sistema de saúde é demorado, e tinha uma viagem marcada com a família (esposa e filhas) para o dia 1º de janeiro para a Austrália.

O resultado não foi bom e o médico me sugeriu cancelar a viagem e, como eu tinha um plano de saúde no Brasil, resolvemos retornar às pressas para fechar o diagnóstico.

Chegando ao Rio de Janeiro fui internado imediatamente e comecei a fazer os exames. A situação estava bem ruim, eu só me alimentava de líquidos e tinha de dormir sentado. Porém, nessa internação iniciei um processo de desinflamação. Em uma semana a gastrite acalmou e desinflamou o sistema digestivo.

Mas daí veio o susto no resultado da biópsia: um tumor de 15 centímetros na parede do abdômen e que já estava expandindo para a parte externa do sistema digestivo, pressionando a parede do intestino. Era câncer. Linfoma não Hodgkin. Imediatamente iniciei o tratamento de quimioterapia para depois de alguns meses fazer um transplante de medula óssea.

Apesar da bomba, senti um certo alívio porque com o diagnóstico poderia me tratar, mesmo com todas as incertezas. A partir daí, comecei a lidar com a situação como sempre fiz na minha vida inteira como um atleta. Coloquei objetivos e usei da minha experiência como atleta profissional para lidar com a doença.

Quando eu foco em uma competição, em um título mundial por exemplo, não falo para ninguém sobre meus treinos. Eu simplesmente faço o que tem que ser feito. E entre essas coisas, geralmente fisicamente exaustivas – como treinar em condições extremas, enfrentar dias de muito frio, ondas ruins, entre outros – e difíceis de vivenciar, eu penso no foco, nos momentos complicados que fazem parte de um processo para um objetivo final maior: a vitória. Apliquei literalmente isso para o meu tratamento. A quimioterapia e tudo mais era parte de um processo para atingir o objetivo final: a cura.

Decidi que quem saberia da minha doença seria apenas a minha família – minha esposa Julli, minha filha mais velha Rafaela e meus pais (Bernard Rajzman, jogador de vôlei olímpico, e a mãe Michelle Wollens, ex-patinadora profissional) – e algumas pessoas bem próximas e ninguém mais. Para não escutar opiniões variadas e até receios e lamentações. Assim consegui manter a minha mente saudável e focada no objetivo final.

Foto – Bernard Rajzman, Phil Rajzman e as filhas Coral e Rafaela – Família ajudou na superação (Crédito: Divulgação

O tratamento é muito, muito doloroso, e não apenas a parte física. Como sou atleta até tenho um limiar de dor alto. Foram seis meses de quimioterapia, com seis sessões pesadas a cada 21 dias, sem contar alguns exames que geravam muito incomodo e dor. Mas essas condições dolorosas fisicamente, não eram o maior desafio. Os efeitos colaterais da quimioterapia são terríveis, porque a medicação mata não só as células ruins, mas as células boas também. Nos dias seguintes ficava destruído fisicamente.

Quimioterapia é pesado mesmo, a cabeça não para, apesar do corpo “destruído”, a cabeça não relaxa igual ao corpo, fica em estado de atenção constante. Por isso sinto insônia, enjoo, mal-estar, euforia, alegria, melancolia….  Com infinitos picos ao longo do dia/noite. Minha cabeça continua intacta, está moleza, foram 33 anos dedicados à competição e a minha mente é uma rocha. Já fisicamente, esse foi o maior desafio da minha vida.

Nesse período, eu também focava em pensar e fazer coisas boas e ficava sentado mexendo na nossa horta, nos dias sem energia. Outra era treinar o Ben, um surfista de 11 anos de idade aqui de Búzios, para o qual faço um trabalho de “coach” há 4 anos. Ele me pediu para começar a participar de competições, então vinha frequentemente em casa, bem cedinho. Isso me animava para ir à praia, sentar na sombra, anotar o que era importante, ver a sua evolução, perceber de perto o quanto ele estava estimulado para competição.

Essa foi uma grande motivação para meu processo de cura. Literalmente me via no Ben, quando eu era criança e comecei no surfe, com todas as curiosidades para a vida. Pude passar os meus conhecimentos da minha trajetória do Circuito Mundial nesse período.   Foi um momento de cura espiritual. Eu sempre busquei esse autoconhecimento durante a minha vida, através da espiritualidade e das viagens pelo mundo. A resiliência e os desafios de um atleta profissional, seja para aprender um novo idioma, adaptar-se à alimentação de cada país, lidar com vitórias e derrotas, foram fundamentais para esse momento de tratamento.

Apesar da situação, eu queria continuar vivendo da forma mais normal possível. E foi o que fiz, com a ajuda da minha família. Nunca tratei o momento como ‘estou doente’, mas sim como ‘estou me tratando’. O fato é que eu não me permitia vitimizar e nem me sentir triste com o que estava passando. Eu tenho muita fé, acredito em uma energia superior.  Agradeci pelo tratamento que recebia, com médicos de excelência. Entreguei nas mãos deles e na de Deus.

Entre uma quimio e outra fiz duas viagens para os EUA, mas uma me marcou. Fui para o Havaí entre a 3ª e 4ª quimio para resolver pendências, pois estava morando lá com a família quando tudo aconteceu. Cheguei durante um dos melhores swell da ilha, amigos me perguntaram por que estava sumido mas não falei sobre a doença enquanto esperávamos a onda. Foi aí que peguei um tubo, não foi como eu gostaria, mas ao atravessar foi uma das melhores sensações dos últimos tempos. A sensação de lavar a alma literalmente e me senti mais vivo do que nunca. Isso foi fundamental para eu voltar para o Brasil e continuar o tratamento.

Foto 2 – Phil aproveitando um swell no Havai, durante o tratamento
(crédito: @dra.liviadugue)

Por incrível que pareça não perdi peso e nem a barba ou pelos do corpo. É certo que ajudaram bastante algumas terapias complementares, como acupuntura e o uso medicinal do Canabidiol (substância química da planta Cannabis sativa) – hoje já bem-conceituado como parte de vários tratamentos de saúde. Seu uso estimulou o meu apetite e me ajudou no sono tranquilo e, também, a manter o peso.

Após seis meses de quimioterapia estava me preparando para a pré-internação antes do transplante de medula óssea e ficaria internado por cerca de 20 dias. E por uns três meses devido à baixa imunidade não poderia ter contato com o público. Eu estava preparado para encarar mais esse desafio de frente.

Agora, em junho, fui fazer os exames (Pet Scan e de sangue) e para minha surpresa algo inacreditável aconteceu: os resultados deram que eu estava 100% bem, nenhuma doença foi detectada, o câncer havia sumido. Os médicos ficaram surpresos com o resultado tão positivo.

Quando a médica disse que eu não precisaria mais fazer o transplante, a minha sensação foi estranha. Todos acharam graça, mas pensei: ‘e agora o que eu vou fazer da minha vida, eu ia internar amanhã e o que farei nos próximos meses?’. Mas assim que a ficha caiu claro fiquei extremamente feliz e ao mesmo tempo ansioso para ter um próximo objetivo. Igual o campeonato que você termina e já tem mais um, e começa a se planejar. Com relação ao tratamento só preciso a partir de agora tomar uma injeção a cada dois meses, nos próximos dois anos. Moleza. O pior já passou com certeza.

O final dessa história foi uma reviravolta igual no começo quando descobri a doença e tive que vir ao Brasil às pressas. Acredito que a minha cabeça, toda a forma com que eu procurei lidar com a doença, contribuiu muito para essa recuperação rápida.

Nos últimos dias, já consegui dar aquela liberada de energia e ir para a água, comemorar e curtir a sensação de felicidade plena. Estou tendo energia novamente para surfar, para estar com minha filha Coral na água e com o Ben. Isso que passei também ajudou a amadurecer a relação com a minha família.

Nesse desafio procurei viver no presente, a valorizar cada momento. Essa é uma coisa que eu aprendi desde novo com os meus pais.  Agora, mais do que nunca entendo que de fato a vida é isso, é preciso aproveitar o convívio com a família, com os amigos, trabalhar no que se ama. E tomar atitudes de uma forma sábia, aprender a perdoar e agradecer.

É muito importante ter fé e acreditar que aquele momento difícil é uma experiência de vida e que algo muito maior vai ser descoberto. Que tudo passa e, de alguma forma, serve para a sua evolução e fortalecimento. Também tentar levar a situação com humor é importante.

Aloha!

*Phil Rajzman é tricampeão mundial de longboard (2007 e 2016 campeão mundial pela World Surf League – WSL e 2004 campeão mundial pela Oxbow Pro), bicampeão Pan-Americano (2007 e 2009) e atleta da elite mundial por 25 temporadas (até 2022). Carioca, 42 anos, foi o primeiro brasileiro a entrar para a história como Campeão Mundial de Surfe, mas no pranchão.

Tem um canal no Youtube (@PhilGood21) e o Instagram e o Facebook @philrajzman

 

 

 

Share on linkedin
Share on facebook
Share on twitter
Share on whatsapp




Deixar um comentário

Você vai se interessar também

Primeira etapa do Circuito Tyr Energia Arpoador Surf Club 2025 - dias 13 e 14 de setembro !

O Planejamento Esportivo 2026 da CBSurf confirma premiação de R$ 450 mil para o "Festival de Surf" do Longboard e Stand Up Paddle nas modalidades SUP Surf e SUP Race

Evento reúne lendas do big surf e contará com o carioca como único competidor usando skimboard, neste domingo (17)

Em agosto, o carioca Rajzman venceu o desafio Hang Five na plataforma Dare, criada para conectar inicialmente amantes do surfe e skate

A quarta etapa da Taça Brasil da Confederação Brasileira de Surf inicia nesta quinta-feira na cidade do campeão olímpico Italo Ferreira no Rio Grande do Norte

Primeiro dia do Circuito Paulista EDP de Surf Colegial 2025 testa coragem e técnica da nova geração com mar agitado e avanço da maré em São Sebastião

Mirella Almeida prefeita de Olinda, recebeu campeões e dirigentes do surfe nacional em seu gabinete e recebeu o convite para prestigiar os grandes eventos que acontecerão no Bairro Novo

Etapa acontece nos dias 9 e 10 de agosto com disputas nas categorias Sub-12 e Sub-14 e soma pontos na corrida por vaga no Brasileiro de 2026

Em sessão inédita, lendas mundiais do esporte surfam juntos na maior piscina de ondas Wavegarden do planeta, enquanto Rodrigo Santoro – um dos atores mais premiados do Brasil, experimenta o jeito de viver exclusivo do novo clube high experience de São Paulo

No total a etapa inicial reuniu mais de 130 atletas de base em dois dias de disputas no Quebra-Mar, em Santos; campeões largam na frente rumo a Portugal

A primeira etapa do Circuito Surf Talentos Oceano 2025 apresentado pela Mini Kalzone e Surfland Brasil será disputada neste próximo final de semana em Balneário Camboriú(SC). A competição, tem o patrocínio da Prefeitura de Balneário Camboriú(SC) e Fundação Municipal de Esportes, será a primeira desta temporada valendo 10 mil pontos para o ranking do Circuito Fecasurf de Base 2025.

O Governo Federal por meio do Ministério do Esporte, apresenta: Circuito Paulista de Surf Colegial. A nova vitrine do surfe de base no estado acontece nos dias 26 e 27 de julho, no Quebra-Mar, em Santos, e abre caminho para definição dos campeões paulistas e da equipe que representará São Paulo no Brasileiro de 2026.

*Por Phil Rajzman Surfar aos 40 anos é uma experiência diferente. Já não é mais só sobre performance, vitórias ou títulos —

O campeão da Taça Brasil 2024, Ryan Kainalo, vai competir em casa pela primeira vez e a campeã brasileira do Dream Tour, Juliana dos Santos, pode liderar os dois rankings

A Layback e World Surf League confirmam realização do WSL Layback Pro Prainha Rio 2025, agora com status QS 4000 ( Em suas primeiras edições, o evento contava com o status QS 1000) O campeonato - sétima etapa do World Surf League (WSL) Qualifying Series (QS), sul-americano - , será realizado de 9 a 13 de julho de 2025 na icônica e paradisíaca Prainha, Zona Oeste da cidade do Rio.

Baterias eletrizantes e high scores marcaram o sexto dia da janela do VIVO Rio Pro apresentado por Corona Cero. Quatro brasileiros seguem na briga pelos títulos do masculino e feminino da nona etapa do Championship Tour (CT) da WSL.

Últimas notícias

Primeira etapa do Circuito Tyr Energia Arpoador Surf Club 2025 - dias 13 e 14 de setembro !

O Planejamento Esportivo 2026 da CBSurf confirma premiação de R$ 450 mil para o "Festival de Surf" do Longboard e Stand Up Paddle nas modalidades SUP Surf e SUP Race

Evento reúne lendas do big surf e contará com o carioca como único competidor usando skimboard, neste domingo (17)

Em agosto, o carioca Rajzman venceu o desafio Hang Five na plataforma Dare, criada para conectar inicialmente amantes do surfe e skate

A quarta etapa da Taça Brasil da Confederação Brasileira de Surf inicia nesta quinta-feira na cidade do campeão olímpico Italo Ferreira no Rio Grande do Norte

Primeiro dia do Circuito Paulista EDP de Surf Colegial 2025 testa coragem e técnica da nova geração com mar agitado e avanço da maré em São Sebastião

Mirella Almeida prefeita de Olinda, recebeu campeões e dirigentes do surfe nacional em seu gabinete e recebeu o convite para prestigiar os grandes eventos que acontecerão no Bairro Novo

Etapa acontece nos dias 9 e 10 de agosto com disputas nas categorias Sub-12 e Sub-14 e soma pontos na corrida por vaga no Brasileiro de 2026

Em sessão inédita, lendas mundiais do esporte surfam juntos na maior piscina de ondas Wavegarden do planeta, enquanto Rodrigo Santoro – um dos atores mais premiados do Brasil, experimenta o jeito de viver exclusivo do novo clube high experience de São Paulo

No total a etapa inicial reuniu mais de 130 atletas de base em dois dias de disputas no Quebra-Mar, em Santos; campeões largam na frente rumo a Portugal

A primeira etapa do Circuito Surf Talentos Oceano 2025 apresentado pela Mini Kalzone e Surfland Brasil será disputada neste próximo final de semana em Balneário Camboriú(SC). A competição, tem o patrocínio da Prefeitura de Balneário Camboriú(SC) e Fundação Municipal de Esportes, será a primeira desta temporada valendo 10 mil pontos para o ranking do Circuito Fecasurf de Base 2025.

O Governo Federal por meio do Ministério do Esporte, apresenta: Circuito Paulista de Surf Colegial. A nova vitrine do surfe de base no estado acontece nos dias 26 e 27 de julho, no Quebra-Mar, em Santos, e abre caminho para definição dos campeões paulistas e da equipe que representará São Paulo no Brasileiro de 2026.

*Por Phil Rajzman Surfar aos 40 anos é uma experiência diferente. Já não é mais

O campeão da Taça Brasil 2024, Ryan Kainalo, vai competir em casa pela primeira vez e a campeã brasileira do Dream Tour, Juliana dos Santos, pode liderar os dois rankings

A Layback e World Surf League confirmam realização do WSL Layback Pro Prainha Rio 2025, agora com status QS 4000 ( Em suas primeiras edições, o evento contava com o status QS 1000) O campeonato - sétima etapa do World Surf League (WSL) Qualifying Series (QS), sul-americano - , será realizado de 9 a 13 de julho de 2025 na icônica e paradisíaca Prainha, Zona Oeste da cidade do Rio.

Baterias eletrizantes e high scores marcaram o sexto dia da janela do VIVO Rio Pro apresentado por Corona Cero. Quatro brasileiros seguem na briga pelos títulos do masculino e feminino da nona etapa do Championship Tour (CT) da WSL.

Generic selectors
Exact matches only
Search in title
Search in content

Agende sua aula